08 Março 2023
Embora sejam pilares das comunidades, as mulheres muitas vezes são esquecidas e invisíveis.
O comentário é da Ir. Anne Béatrice Faye, das Irmãs da Imaculada Conceição de Castres e membro da Comissão Teológica da Assembleia do Sínodo dos Bispos sobre a Sinodalidade.
O artigo foi publicado em La Croix International, 06-03-2023. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Se há um segmento da sociedade que é vítima das piores injustiças na África, são as mulheres. Consideremos, por exemplo, o lugar que elas ocupam na educação, no emprego, no desemprego, na pobreza, na política, na guerra, na paz, na ecologia, no direito, no desenvolvimento, na terra, na cultura, na tradição, na família, no casamento, na saúde, até mesmo no esporte ou em qualquer outra questão social.
Podemos ver que a contribuição das mulheres muitas vezes não é valorizada. Embora sejam pilares na vida das comunidades eclesiais, e apesar do fato de a lei da Igreja ter aberto muito as portas para as mulheres, elas permanecem entre as que menos contam na tomada de decisões.
Além disso, são confrontadas com grandes desafios sociais, como a mutilação genital feminina, o casamento precoce ou forçado e os dolorosos ritos da viuvez que ferem profundamente sua dignidade.
Apesar da inegável evolução da consciência eclesiológica em relação às mulheres, de seu dinamismo e de seu empenho na Igreja, a realidade nem sempre acompanha as aberturas de princípio reconhecidas pela Igreja. Na África, as mulheres não são suficientemente ouvidas. Como agentes de mudança, de coesão social e como guardiãs da tradição, elas parecem duplamente esquecidas e muitas vezes “invisíveis”. Por essa razão, as Igrejas africanas ainda parecem excessivamente clericais, patriarcais e hierárquicas.
Felizmente, hoje, há um forte desafio à sua marginalização. Um dos sinais mais marcantes é a crescente consciência de sua dignidade e de seu papel relevante tanto na sociedade quanto na Igreja em geral. Questões referentes a seu lugar na Igreja Católica e na hierarquia são recorrentes.
Algumas mulheres enfatizam um sentimento de injustiça em relação a seu lugar na Igreja. Como, por exemplo, podemos iniciar um processo sinodal se a “questão de gênero” não é resolvida pela Igreja? Diante de um mundo em plena decadência moral, diante de famílias cristãs em dificuldades, não deveria ser claramente especificado o papel dos cônjuges, especialmente o da esposa, para uma sólida educação familiar cristã?
Existe uma forma de entendimento que os homens naturalmente não podem ter. Seguir uma política tipicamente feminina pode significar promover a paz e resolver os conflitos de maneira diferente da dos homens e escolher um meio diferente da violência e da guerra para resolver os conflitos, fazendo avançar assim os valores positivos para um sentido mais profundo. As operações de paz poderiam ser mais efetivas se as mulheres fossem mais envolvidas.
As mulheres não só dão a vida, mas nos dão a capacidade de ver além, de entender o mundo com outros olhos, de ouvir, de ver as coisas com um coração mais criativo, mais paciente, mais terno. Isso significa que o lugar delas na Igreja precisa ser repensado completa, urgente e profundamente, assim como teologicamente.
É necessário ouvir o que as mulheres dizem sobre a maneira como são tratadas na Igreja. Ouvir seu ponto de vista a fim de lhes dar voz para que possam se exprimir sem serem sempre relegadas para a periferia, isto é, serem vistas e não ouvidas.
Sempre e em todos os lugares, as mulheres dão uma contribuição muito importante para a vida da Igreja, mas muitos cargos – especialmente de liderança – são abertos apenas aos homens. As mulheres desempenham um papel fundamental nas comunidades eclesiais africanas. Elas fazem uma contribuição significativa para sua vida espiritual e material; estão envolvidas nas paróquias, na animação litúrgica, na catequese, nos grupos de oração, nos corais.
São sobretudo as mulheres que possibilitam o desenvolvimento das atividades caritativas, sem esquecer que elas se ocupam da limpeza da igreja, da manutenção e da assistência aos ministros em suas necessidades cotidianas. É preciso que a Igreja estabeleça ministérios para as mulheres e intensifique seus esforços para promover sua formação.
Por fim, notamos a importância do lugar e do papel das mulheres consagradas na Igreja na África. É importante incluir as mulheres no processo de tomada de decisão dentro da Igreja. Elas se entregam com tanta generosidade aos pobres, aos doentes, às mulheres e à educação dos jovens, com uma fidelidade que às vezes as leva ao martírio.
Mediante a promoção de indivíduos e comunidades humanas, elas põem em ação a ternura de Deus para todos e todas. As mulheres consagradas podem assim ajudar a Igreja africana a tornar mais transparente a perspectiva do serviço do ponto de vista da dedicação, da doação, do acolhimento, da escuta e da atenção concreta aos pequenos e aos pobres. Tudo isso pode ajudar a desafiar certas formas mentais de pensar e organizar a vida da Igreja.
As mulheres em geral, portanto, podem ajudar a Igreja africana a tornar mais transparente a perspectiva de serviço específica ao poder do Evangelho, sobretudo do ponto de vista da dedicação, doação, acolhimento, escuta, atenção concreta aos pequenos e aos pobres. É uma perspectiva capaz de ajudar as pessoas a questionarem certos padrões de pensamento, certos preconceitos ou formas de se entender e de se organizar a vida eclesial.
Já não se trata simplesmente de lutar por uma visão mais igualitária dos direitos, para que as mulheres cumpram os mesmos deveres. Trata-se ainda menos de reivindicar que elas possam desempenhar seus papéis da mesma forma que os homens, mas de dar lugar e valorizar as especificidades e a reciprocidade, a fim de alcançar uma eclesiologia de comunhão capaz de acolher e valorizar as diferenças, para contribuir efetivamente com a missão da Igreja.
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“O lugar da mulher na Igreja precisa ser repensado”. Artigo de Anne Beatrice Faye. - Instituto Humanitas Unisinos - IHU